O Festival O Boticário na Dança encerrou ontem em São Paulo. Consegui ver todos os espetáculos, então aproveito agora para fazer um apanhado dos altos e baixos do evento. Lá vai.
Sobe
- A curadoria: Ao bancar a vinda ao Brasil de quatro companhias internacionais completamente inéditas pelas bandas de cá, todas com trabalho sedimentado a partir dos anos 2000, a curadoria do alemão Dieter Jaenick (ex-Carlton Dance) demonstra uma ousadia aparentemente abandonada pelas produtoras que costumam trazer grandes grupos estrangeiros e se acostumaram a apresentar repetecos não só de grupos, mas até mesmo de programas, como se quisessem reprisar o sucesso obtido em turnês anteriores. Sabemos, porém, que a coisa não funciona bem assim e nada garante público.
- O preço dos ingressos: Não surpreende que o Festival tenha iniciado com todas as apresentações com ingressos esgotados. Afinal, pagar R$ 20 para ver uma produção exigente do ponto de visto logístico, com cenários robustos e elenco vasto, não é nem razoável, é barato mesmo. E começar tudo com garantia de casa cheia – e de filas de espera longuíssimas – dá um gostinho bem saboroso na boca.
- A opção por organizar um festival: Tenho um chute. Pelo que vi nestes últimos dias, organizar apresentações encarrilhadas dia após dia, usando um mesmo bombardeio de divulgação para todas as atrações, é mais eficiente para a formação de público novo do que a organização de temporadas. Claro que os habitués da cena da dança contemporânea de São Paulo estavam por lá, mas o que marcou foi ver mesmo muita cara nova, e em repetidos dias. Ponto para o ingresso barato e a divulgação.
Desce
- Privilégio da Shen Wei: Não deu pra entender muito bem por que a Shen Wei Dance Arts foi a única contemplada com dois dias de apresentação. Ok, o programa foi interessante – uma dobradinha com "A Sagração da Primavera" e "Folding" –, dando vazão a aspectos completamente distintos de uma mesma companhia, com a primeira peça extremamente virtuosa e a outra com uma dramaturgia mais bem trabalhada e emocionante. O problema é que faltou a ela o impacto que uma obra como a de Hofesh Schechter teria para abrir os trabalhos.
- Encerramento numa segunda (!): Também não deu pra entender de jeito nenhum por que resolveram por fim ao festival numa segunda-feira – ainda mais quando o programa de encerramento seria o mais longo de todo o festival, numa sequência da Quasar e do Grupo de Rua de Niterói, cada um com trabalhos de 60 minutos de duração. A perspectiva de fim para depois da meia-noite, quando o transporte público fica escasso, fez mais da metade do público se mandar antes da hora, no meio do espetáculo, o que é sempre péssimo. Além disso, perdeu-se a oportunidade de fechar de forma apoteótica, como uma grande festa. Sair do Auditório vendo aquele monte de poltronas já vazias deixou um gostinho ruim.
- Grupo de Rua de Niterói: O trabalho mais desafiador de todo o Festival foi também o mais mal programado. Apesar de seguir a linhagem da popular street dance, "H3" não é uma peça de simples absorção, que causa empatia de cara. Ela demanda tempo e abertura do público, algo que só se consegue numa intricada negociação entre artista e plateia que dificilmente se realizaria às 22h30 de uma segunda-feira, hora em que a peça começou, logo após "No Singular", trabalho de verve muito pop da Quasar. Acabou que uma coisa não combinou com a outra, apesar de os dois espetáculos funcionarem bem (mas cada um no seu quadrado).
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