Elenco oprimido de "Sra. Margareth" todo juntinho. Crédito: Divulgação |
Há algo de muito animador no programa que a Cisne Negro Cia.
de Dança apresentou no fim de junho no Teatro Sérgio Cardoso. Enxuto na medida
certa para uma temporada popular, ele soube evidenciar o que o grupo tem de
melhor: a versatilidade e a qualidade técnica de seus competentíssimos
bailarinos.
A abertura ficou por conta de “Revoada”, de Gigi Caucileanu,
criada em 2007 para celebrar os 30 anos da trupe fundada por Hulda Bittencourt.
De cara, a peça mostra a habilidade do coreógrafo em dialogar de forma clara –
e eficiente – com o propósito da encomenda. Isso se vê logo no título – uma
referência explícita ao nome da companhia – e nos tutus vermelhos do figurino –
releitura atualizada do corpo de baile do clássico balé de repertório “O Lago
dos Cisnes”, do qual o Cisne Negro é um dos personagens centrais.
A eficácia conquistada por Caucileanu está também presente
na trilha escolhida: excertos de “Pássaro de Fogo” e “Fireworks”, ambas de Igor
Stravinski (1882-1971), que exaltam não apenas outro tipo de ave, mas,
principalmente, outro tipo de ação diferente da do balé. É como se o
coreógrafo quisesse apontar a evolução do grupo, que nasceu dentro do clássico,
bateu asas e se transformou em algo maior, firmando-se como um conjunto
contemporâneo sólido.
Isso se vê na movimentação, que inverte papéis e tira os
homens do tradicional posto de partner, em duos, e os faz apresentar um
virtuosismo e um protagonismo costumeiramente relegados às
mulheres no balé. Apesar dessa escolha, a peça ainda segue um lirismo
próprio do clássico – que o grupo nunca abandonou enquanto técnica. Ele ganha ainda
mais beleza quando executado com este elenco afiado (mas que não perderia nada se afinasse um tantinho mais a sincronia).
“Revoada” fez um contraste positivo com a estreia nacional
de “Sra. Margareth”, de Barak Marshall. Baseado na dança-teatro, o trabalho é
um recorte de “Monger”, de 2008, primeira criação do coreógrafo desde que
deixou o posto de residente na prestigiada Batsheva Dance Company, em Israel.
Não há exatamente uma narrativa a ser contada, mas o argumento põe os
bailarinos como funcionários presos em um porão por uma patroa abusiva.
A movimentação de Marshall é vigorosa como a de Caucileanu,
mas segue uma linha mais pop que conversa muito bem com uma geração que cresceu
vendo divas como Madonna e Beyoncé. Esse, aliás, é o melhor aspecto da obra:
saber fazer-se impactar em um público que não está acostumado a ver dança, mas
de forma inteligente, com uma dramaturgia equilibrada capaz de manter a peteca no ar
durante todo o tempo de duração. Com isso, "Sra. Margareth" se afirma como a melhor estreia do Cisne Negro em anos.
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